A expressão «Igreja em saída» é do Papa Francisco,
que desde o início do seu pontificado nos tem desafiado a ser uma Igreja que
não se fecha sobre si mesma, em seus assuntos de sacristia e cúria, mas que se abre
às reais necessidades da humanidade, de quem é servidora. Na sua primeira
entrevista à revista Civilità Cattolica, a papa
disse: «Vejo a Igreja como um
hospital de campanha depois de uma batalha. É inútil perguntar a um ferido
grave se tem o colesterol ou o açúcar altos. Devem curar-se as suas feridas.
Depois podemos falar de tudo o resto. Aquilo de que a Igreja mais precisa hoje
é a capacidade de curar as feridas e de aquecer o coração dos fiéis, a
proximidade».
Na sua exortação apostólica «A alegria do Evangelho», o papa dedica todo o primeiro capítulo ao tema
da «Transformação missionária da Igreja», e a certa altura ele afirma: «Essa alegria é sinal de que o evangelho foi
anunciado e está dando fruto. Mas, sempre tem a dinâmica do êxodo e do dom, de
sair de si, de caminhar e semear sempre de novo, sempre mais adiante» (EG,
21), e, ainda, «A Igreja em saída é a
comunidade de discípulos missionários que “primeream” (tomam a iniciativa,
adiantam-se, vão primeiro), que se
envolvem, que acompanham, que frutificam e festejam» (EG, 23).
Dentro em breve, em 2016, vamos celebrar os
200 anos do êxodo da Beata Francisca
Paula de Jesus – Nhá Chica – de São João Del’Rei para Baependi. Não
conhecemos bem as motivações dessa mudança. Contudo, sabemos que, na vida dos santos, nunca falta a
experiência do êxodo. Viveu-a Abraão, ao deixar a sua terra e a sua família por ordem de Deus: «Sai da tua terra e vai para onde eu te vou
mostrar» (Gn 12,1). Viveu-a todo o povo de Israel, que saiu do Egito, da
terra da escravidão, guiado por Moisés, à procura da Terra da Promessa, onde há
vida e liberdade, onde «corre leite e mel»
(Ex 13,3ss) e então percebeu-se como «povo de Deus». Por fim, viveu-a nosso
Senhor Jesus Cristo, que sendo rico, fez-se pobre; sendo Deus, fez-se homem, «esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição
de servo, tornando-se em tudo semelhante aos homens; e, feito homem,
humilhou-se, obedecendo até à morte, e morte de cruz» (Fl 2,7-8). Viveu-a
também Nhá Chica ainda criança, deixando com sua mãe e seu irmão o arraial de
Santo Antônio do Rio das Mortes, onde se criara, onde estavam os parentes, onde
havia alguma segurança, ainda que pequena, para descortinar uma vida nova na
vila de Baependi, naquela altura promissora pelos desenvolvimentos da agricultura
local e da recente elevação à categoria de vila, mas sem dúvida uma vida cheia
de insegurança, de encontro com o desconhecido. Isto não deixou de moldar na
beata e em sua família a confiança em Deus e na Senhora da Conceição, e também
uma abertura existencial para acolher o diferente, o sofredor, o pobre como
eles.
Eis o
nosso desafio hoje: fazer o nosso êxodo, não apenas geográfico,
mas espiritual; ter a coragem de sair de nós mesmos, das nossas zonas de
conforto, das regras e leis que nos dão segurança, dos nossos domínios e
arriscar-nos numa «Igreja em saída», que sobretudo acolhe – como acolhia a
beata Nhá Chica –os mais pobres, que acolhe os aflitos, que acolhe os
diferentes, os que não pensam como nós, que não vivem a fé como nós, que não se
comportam como nós, que acolhe sem perguntar «se tem o colesterol ou o açúcar altos», que acolhe e «cura as feridas, aquece o coração, se
aproxima (torna-se próximo)».
O
santuário é este espaço de acolhida, de abertura, onde todos têm
vez e voz, onde todos devem encontrar alguém que os escute, os abrace, cure as
suas feridas, lave os seus pés peregrinos, aqueça o seu coração e os faça
sentir-se em casa, na casa de Nhá Chica. Mas, para isso, a beata hoje precisa
de nós, de cada um de nós que vai ao santuário para que sejamos nós os
acolhedores, os escutadores, os abraçadores, os lavadores de pés em seu nome.
Assim nos aproximaremos, a exemplo dela, da «Igreja em saída», da «Igreja
hospital de campanha» a que nos desafia o papa Francisco e o exemplo de
Francisca.
Pe. Jean Poul Hansen
Artigo originariamente
publicado no
Informativo Nhá Chica nº
83, Novembro 2014
(http://www.nhachica.org.br).
Confesso que a expressão do Papa Francisco: "uma Igreja em saída", a princípio, me pareceu um pouco estranha. Agora entendi. E gosto de uma Igreja assim, uma Igreja que sai de si mesma para encontrar as pessoas.
ResponderExcluirIsabel Gomes